19.8.05

_ Seus olhos eram da cor dos mais deliciosos pesadelos ...

Escrevi um conto essa semana. Vou postá-lo assim que terminar de postar o Mil Horas. Aguardem... só preciso de tempo para digitá-lo. Meu tempo anda tão curto... Ainda bem que fantasmas não cobram prazos.

_ " ... estar sem alma seria uma doença?"

A alma as vezes pesa tanto em nossos corpos, que a única coisa que desejamos é nos livramos dela...

Mil Horas
* Parte 5 *

Voltou para o emprego sentindo o estômago revirar. Surpreendeu-se com o poder das três bolachas, mas lembrou-se que junto com elas, haviam alguns litros amargos de magoa. Ao respirar o ar pesado do escritório seu corpo decidiu fazer o que ela mais precisava fazer: vomitar. Saiu em disparada em direção ao banheiro, mas ainda teve tempo de ouvir o comentário mais infeliz do dia.
_ Deve estar grávida.
E seguiu aquela risada pegajosa e forçada pairando pelo ar, como se a perseguisse. Aquela maldita sabia... Não podia ter filhos. E isso era uma de suas maiores dores, seu maior pesar... Sua ferida aberta, impossível de cicatrizar. Sua vontade de vomitar aumentou ainda mais, abriu a porta com violência e trancou-se lá. Caiu aos pés do vaso e libertou-se. Não vomitou apenas a comida indigesta, mas também o amor. A dor, a mágoa, o ódio, a frustração... Vomitou a alma por inteiro. Estava quase vazia, sentindo o peso quer era seu ser finalmente aliviado. Mas não chorou ou sorriu, permanecendo segura no silêncio e na imobilidade.
Depois de um tempo, ergueu-se, limpou-se e deparou-se com o espelho. Seus olhos estavam limpos e sentiu seu peito que não mais abrigava um coração, leve. Saiu.
_Nossa, você está com uma aparência doente... É melhor ir para casa descansar, querida.
O perfume não incomodou, mas precisava vomitar as últimas vibrações emotivas de seu ser, a última gota de humanidade de seu corpo.
_ Você está sempre com essa aparência ridícula e de vagabunda e ninguém incomoda. Assim, faz o favor de não me encher!
O rosto tão sorridente tingiu-se de vermelho intenso, vermelho vergonha, vermelho raiva. Seus lábios abriram-se para dar uma resposta ácida, mas ela já tinha lhe dado as costas. Apesar de vir de quem vinha, não era uma má idéia ir pra casa. Pediu para ir mais cedo e o chefe, observando-a com pena, liberou desejando-lhe melhoras.
_ Você parece doente mesmo... _ ele lhe disse. Mas, pensou ela, estar sem alma seria uma doença?

Continua ...

14.8.05

_ Estou atrasada, preciso correr.

Cursinho e colégio ao mesmo tempo é pesado. Mas estou gostando, sabe? Porque a vida boa acabou de vez, agora que estou quase adulta, nunca mais paz e sossego, não é verdade? Nessa idade, começa a luta cruel por um futuro... por estudo, por um emprego... As vezes me dá vontade de eternizar os 16, por exemplo. Aquela parte onde a adolescência está totalmente amadurecida e a idade adulta ainda está dando os primeiros sinais. Época que as responsabilidades estavam ainda aparecendo, preocupações e decisões eram pequenas. Se eu estou querendo fugir da vida? Não, só dá saudade as vezes. Porque sabe, a memória torna até os mais amargos momentos doces e sem falhas... Ela nos traí, criando um passado menos amargo que nos dê mais esperanças que o futuro seja melhor e que o presente é apenas uma passagem, as vezes, cruel. Mas nenhum dos dois tempos tem verdadeira importância.... Apenas o presente é grande, a única coisa que podemos realmente sentir. Mas o homem não aprendeu ainda e vive o presente em função do futuro. E eu, sou mais um desses humanos, alimentada pela memória falsa de um passado mais tranquilo e pela construção de um futuro incerto que fingimos ter total segurança que será bom.

_ Comprei até uma rosa para ela.

Sentença de morte ou libertação? As vezes a morte é a única solução...

_ " ... lutava ferozmente em silêncio ... "

Nossa personagem realmente está tendo um dia péssimo. Quanto tempo mais pra ele acabar?


Mil Horas
* Parte 4 *


_ Terminou. Só...
_ Oh... Sinto muito. Mas você vai ficar bem com o tempo, viu?
Agradeceu com os olhos, pois a voz não permitiu fazê-lo. Foi quando sentiu um perfume exageradamente doce e nauseante às costas. O barulho irritante do salto confirmou a presença.
_ Acabou? Ahhhhh, que pena! Vocês estavam tãoooo bem. Tãoooo irônica! Queria fazê-la engolir aquele tom. Era tão impiedosa e descarada que sequer se deu ao trabalho de esconder o sorriso. Era conhecida sua queda por seu namorado, mas ele a rejeitou, preferiu a menina tímida e graciosa, segundo ele mesmo. Assim como nunca trocava de perfume, aquela cínica nunca aceitara a derrota. E vivia celebrando as briguinhas e desentendimentos do casal.
_ Pois é, estávamos.
_ Ah, mas não se preocupe! Aliás, sempre achei que vocês não combinavam, sabia! _ Deu aquela risadinha forçada e saiu rebolando, com um sorriso tão imenso que mesmo de costas, sabia-se que sorria.
_ Sujeitinha mais...
_ Vadia.
O ódio por aquela “sujeitinha” parecia ser geral. Sua arrogância e convencimento eram intragáveis. Só o chefe, que idolatrava suas curvas, seus cabelos loiros tingidos e sua tremenda falta de caráter e cérebro, suportava-a. Mas ela estava cansada demais para se preocupar com pequenas pessoas como aquelazinha. Refugiou-se em suas obrigações que eram muitas, aliás.
_ Vamos almoçar?
_ Desculpa, mas hoje não...
Evitou o restaurante onde sempre comia. Não tinha apetite e o cheiro, outrora sedutor, repeliu-a para ainda mais longe. Foi caminhando, sem rumo e acabou em uma agradável praça cheia de arvorezinhas floridas e tão coloridas, grama recém cortada, passarinhos brincando e rodopiando pelo ar tão livres... E algumas pessoas curtindo sua hora de almoço. Parou em uma vendinha para comprar um pacote de bolachas. Apesar de estar totalmente sem fome, não podia ficar tanto tempo sem comer. Jogou-se em um banco e ficou observando o movimento. Viu felicidade, tanta felicidade... Estava compartilhando daquele sentimento a menos de uma semana atrás, mas agora aquilo lhe parecia tão distante... A contra gosto engoliu três bolachas, enquanto lutava ferozmente em silêncio contras as lágrimas. Não conseguiu comer mais. Seu corpo simplesmente parecia determinado a expelir coisas.

Continua ...

2.8.05

_ Qual lugar mais bonito em que você já esteve?

Ah, respiro aliviada! Livre de toda aquela coisa horrível que estava grudada em cada poro de meu corpo, em cada espaço do meu coração. Tempestade foi-se de vez, abrindo lugar para um céu maravilhosamente límpido e azul. Espero que dure... Acho que gritar e chorar faz um bem danado no final, pois expulsa tudo que há de ruim no corpo e na alma. Vivo dias mais tranquilos, mais seguros e felizes. Esperançosa e determinada, como gosto de estar. Porque vivemos de tempestades e calmarias. E esse é meu período de calmaria, enfim.

_ " ... estava insensível às coisas do mundo. "

Minha personagem ao contrário, vive sua fase de tormenta. Final eu diria. A tempestade que não vai embora nunca, o momento em que se desiste de lutar, respira-se fundo e não se sente mais nada. Que será dela?

Mil Horas
* Parte 3 *
Não tomou seu café da manhã. Seu estômago não sentia fome e estava um pouco enjoado. Tinha que sair rápido, pois já estava atrasada para pegar seu ônibus. Mas não se importava... Um ônibus a mais ou a menos, dez ou quinze minutos de atraso não fariam diferença. Aliás, nada parecia fazer diferença aquele dia... O trânsito não a irritou, pois estava insensível às coisas do mundo.
Ao pegar o elevador e apertar o botão do décimo andar, lembrou-se que odiava seu emprego: as pessoas, o lugar apertado e barulhento, a quantidade enorme de tarefas e aquele chefe sempre mal humorado. Sua função não era má, mas todo o resto mal podia suportar. Talvez se só fosse enfiar a cabeça no trabalho... Mas tinha que conviver e a convivência era sempre problemática. Naquele dia mesmo, ouviria os comentários maldosos sobre sua aparência insone diretamente de sua “inimiga” de trabalho, sempre arrogante e prepotente. Também havia a bronca que levaria do chefe pelo atraso e como ouvir sua voz molenga e pastosa reclamando pelos malditos quinze minutos não bastasse, ainda receberia tarefas extras “pra ontem”, como ele gostava tanto de dizer e dar risada, como se aquela frasezinha inútil tivesse alguma graça. Só havia uma pessoa que considerava, sentava-se ao seu lado em uma mesa organizada e impecável. Era uma mulher com um coração bondoso e extremamente tranqüila.
A porta do elevador se abriu. Ela respirou fundo e entrou cabisbaixa, desejando que ninguém percebesse sua quase inexistência.
_ Quinze minutos de atraso, mocinha.
_ É, eu sei. Desculpa, o ônibus atrasou.
A bronca não se prolongou e ela agradeceu. Sentou-se pesadamente na cadeira e ligou o computador.
_ Bom dia!
_ Oi.
_ Que aconteceu?
_ Não dormi a noite.
_ Só isso mesmo? Quer conversar?
Ela sempre tinha essa atitude preocupada. Quantas vezes não a vira com aquele rosto pálido triste e não se sentara com um sorriso pra ouvir-lhe as reclamações? Mas não, ela não queria conversar, explicar os olhos inchados, simplesmente queria deixar tudo trancado no apartamento junto com a toalha e o xampu.
Continua ...