14.8.05

_ Estou atrasada, preciso correr.

Cursinho e colégio ao mesmo tempo é pesado. Mas estou gostando, sabe? Porque a vida boa acabou de vez, agora que estou quase adulta, nunca mais paz e sossego, não é verdade? Nessa idade, começa a luta cruel por um futuro... por estudo, por um emprego... As vezes me dá vontade de eternizar os 16, por exemplo. Aquela parte onde a adolescência está totalmente amadurecida e a idade adulta ainda está dando os primeiros sinais. Época que as responsabilidades estavam ainda aparecendo, preocupações e decisões eram pequenas. Se eu estou querendo fugir da vida? Não, só dá saudade as vezes. Porque sabe, a memória torna até os mais amargos momentos doces e sem falhas... Ela nos traí, criando um passado menos amargo que nos dê mais esperanças que o futuro seja melhor e que o presente é apenas uma passagem, as vezes, cruel. Mas nenhum dos dois tempos tem verdadeira importância.... Apenas o presente é grande, a única coisa que podemos realmente sentir. Mas o homem não aprendeu ainda e vive o presente em função do futuro. E eu, sou mais um desses humanos, alimentada pela memória falsa de um passado mais tranquilo e pela construção de um futuro incerto que fingimos ter total segurança que será bom.

_ Comprei até uma rosa para ela.

Sentença de morte ou libertação? As vezes a morte é a única solução...

_ " ... lutava ferozmente em silêncio ... "

Nossa personagem realmente está tendo um dia péssimo. Quanto tempo mais pra ele acabar?


Mil Horas
* Parte 4 *


_ Terminou. Só...
_ Oh... Sinto muito. Mas você vai ficar bem com o tempo, viu?
Agradeceu com os olhos, pois a voz não permitiu fazê-lo. Foi quando sentiu um perfume exageradamente doce e nauseante às costas. O barulho irritante do salto confirmou a presença.
_ Acabou? Ahhhhh, que pena! Vocês estavam tãoooo bem. Tãoooo irônica! Queria fazê-la engolir aquele tom. Era tão impiedosa e descarada que sequer se deu ao trabalho de esconder o sorriso. Era conhecida sua queda por seu namorado, mas ele a rejeitou, preferiu a menina tímida e graciosa, segundo ele mesmo. Assim como nunca trocava de perfume, aquela cínica nunca aceitara a derrota. E vivia celebrando as briguinhas e desentendimentos do casal.
_ Pois é, estávamos.
_ Ah, mas não se preocupe! Aliás, sempre achei que vocês não combinavam, sabia! _ Deu aquela risadinha forçada e saiu rebolando, com um sorriso tão imenso que mesmo de costas, sabia-se que sorria.
_ Sujeitinha mais...
_ Vadia.
O ódio por aquela “sujeitinha” parecia ser geral. Sua arrogância e convencimento eram intragáveis. Só o chefe, que idolatrava suas curvas, seus cabelos loiros tingidos e sua tremenda falta de caráter e cérebro, suportava-a. Mas ela estava cansada demais para se preocupar com pequenas pessoas como aquelazinha. Refugiou-se em suas obrigações que eram muitas, aliás.
_ Vamos almoçar?
_ Desculpa, mas hoje não...
Evitou o restaurante onde sempre comia. Não tinha apetite e o cheiro, outrora sedutor, repeliu-a para ainda mais longe. Foi caminhando, sem rumo e acabou em uma agradável praça cheia de arvorezinhas floridas e tão coloridas, grama recém cortada, passarinhos brincando e rodopiando pelo ar tão livres... E algumas pessoas curtindo sua hora de almoço. Parou em uma vendinha para comprar um pacote de bolachas. Apesar de estar totalmente sem fome, não podia ficar tanto tempo sem comer. Jogou-se em um banco e ficou observando o movimento. Viu felicidade, tanta felicidade... Estava compartilhando daquele sentimento a menos de uma semana atrás, mas agora aquilo lhe parecia tão distante... A contra gosto engoliu três bolachas, enquanto lutava ferozmente em silêncio contras as lágrimas. Não conseguiu comer mais. Seu corpo simplesmente parecia determinado a expelir coisas.

Continua ...

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