15.10.14

Love Reign O'er Me

               Eu não me importo se amanhã você se for e não voltar mais. Não hoje, enquanto assisto ao seu sono tranquilo, satisfeito. O jeito que a luz da lua entra pela janela, inunda o quarto desse sentimento que, se amanhã você se levantar dessa cama e for para não voltar, tudo bem. Valeu a pena. Por cada segundo que passamos, desde o momento em qual você apareceu, tão despretensiosamente, até aqui, meu. Nem que só por mais essa noite.
                Cansei de viver correndo atrás do amanhã, gastando tudo que tenho, o agora, pensando no momento em que você irá embora. De imaginar quando e como você irá partir meu coração. Gostaria de lhe acordar agora, te envolver em um abraço muito forte, respirar o aroma delicado da sua pele. Mas isso é para depois. Agora quero me esforçar para guardar não você, somente, mas esse nosso momento, com todas suas cores e luzes e sombras, para sempre no meu coração. Pois se você for embora ao amanhecer, levando embora tudo de bom que há entre nós, eu sempre terei esse instante. E ninguém, nem mesmo a crueldade das garras do tempo, há de tirá-lo de mim.
                E um dia você não estará mais aqui, eu sei. Talvez seja eu que parta, mas ainda que eu vá embora, vou levar essa noite comigo. E as músicas que ouvi você cantar tão apaixonadamente, mesmo que desafinando. E os riffs de guitarra que me fez prestar atenção? Até para o baixo que eu nem ligava... ou ainda essas músicas que cantamos juntos, às vezes nos imagino em um musical, daqueles bem clássicos, onde colocaríamos nossos elegantes chapéus e tiraríamos desconhecidos e velhinhas para dançarem com a gente. Um dia, quem sabe, vou odiar todas essas músicas por serem não só suas, mas nossas, mas eu não me importo. Não hoje. Agora elas me fazem rir e sorrir, eles me aproximam de você. Quando você não está, elas estão.
                Ainda que daqui a umas horas ou alguns anos você não esteja na minha cama ou na minha vida, vou lembrar das nossas conversas intermináveis, de como fomos tímida mas tão espontaneamente nos conhecendo, descobrindo tantas coisas em comum, rindo de nossas piadas tão infantis, tão nossas. Somos como loucos, quase não levando essa vida a sério. Um dia, talvez, a simples menção de seu nome faça lágrimas brotarem dos meus olhos, mas esse seu sorriso inocente sempre vai aquecer meu coração, ainda que o faça doer um pouco também. Ou sua risada interminável, caudalosa, tão entregue. Sua vitalidade, que ilumina seus olhos, eu a sorvo quase de forma egoísta. Mesmo que sabe-se lá quando, ela vá preencher e a vida de outra pessoa e não mais a minha, eu já ganhei umas horas de vida por causa dela. E alegria, ah, a alegria! Sua presença é como um raio de sol atravessando minha pele, aquecendo minha alma, como respirar ar fresco pela primeira vez em tanto tempo. É da forma mais clichê que conheço, o arco-íris depois da tempestade. Então, se você me disser adeus amanhã ou na semana que vem, ainda estarei cheia de gratidão por tudo que vivemos até agora.
                Quando não houver mais seus lábios, tão sensuais e convidativos para beijar por horas, ainda sim terei gravado em mim esses momentos cinematográficos tão bons de lembrar, relembrar, reviver... Aquela tarde, onde o sol precioso de outono aquecia minha nuca descoberta, que logo em seguida era acariciada pela brisa fresca, e você ali ao meu lado, sem que eu pudesse lhe tocar, apenas observar, admirar, querer... Ou naquela mureta, o céu confuso com a tempestade que se formava, o cheiro da chuva por vir e dos pinheiros que nos observavam, ouvindo aquele solo que você tanto adora, sentindo os pelos do meu braço se arrepiarem aos poucos pelo clima, pela expectativa, pela promessa... nossos lábios finalmente se tocando, como nos entregamos a cada toque. Ah, o mundo e as pessoas simplesmente não existiam, só aquela sensação de plenitude, de enganar o próprio tempo, de termos algo mais importantes do que qualquer outra coisa, de sermos e compartilharmos. Você abriu os olhos e sorriu. Ainda que não haja mais amanhã, eu terei essa memória, essa tarde, tão doce, tão pacifica.
                Quando essa noite tiver fim, quando o primeiro pássaro cantar ainda sonolento e o vizinho ligar a TV, eu ainda a terei, intacta em um lugar especial do meu coração. Saberei mais do que de cor as curvas do seu corpo, a força do seu desejo, seus suspiros longos, o calor da sua pele, a intensidade do seu olhar que não deixa o meu. Ela vai ser preciosa ainda que um dia não nos suportemos, eu vou amar essa noite. E tudo que nos levou a ela. Vou respeitar esse sentimento e protege-lo dos horrores da vida. E toda vez que me lembrar dela, eu vou amar você de novo, só mais um pouco. E ainda que seja mordida pela tristeza e pela desilusão, vou saber que um dia eu fui mais que isso, mais que dor e vazio. Vou saber que desafiamos o tempo, que eu não só vi, mas vivi a beleza e a verdade... a mágica. Sim, a mágica, uma vez ao menos fui tocada por ela. Ainda que, quando você for, leve junto meu coração, eu sei que valeu a pena. Afinal, o que é a vida senão essa sucessão de dias longos e cinzentos, permeados por esses momentos de graça?
                Então, se você se for... eu vou entender e seguir a vida, cabeça erguida e com todos esses pequenos pedaços de alegria nos bolsos.
                Mas... seria tão bom se você ficasse...

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